O fisioterapeuta desempenha papel fundamental no tratamento da Covid-19 e após a alta hospitalar. Simples exercícios fisioterapêuticos respiratórios também ajudam a evitar a doença.

Um levantamento do jornal O Globo mostra que, até 14 de maio, cerca de 200 mil profissionais de saúde brasileiros estavam afastados de suas funções. O motivo: suspeita de Covid-19 – sigla em inglês para “doença do coronavírus 2019”, ano do primeiro caso registrado, na China – ou contaminação confirmada.

São médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e, entre outras categorias, também fisioterapeutas. Todos na linha de frente contra um inimigo invisível, ainda pouco conhecido da ciência e fatal. Só no Brasil, até a publicação desta matéria, o novo coronavírus já havia tirado a vida de 45 mil pessoas.

O fisioterapeuta desempenha um papel fundamental na prevenção e no tratamento da Covid-19. Como o vírus, na pessoa infectada, afeta primariamente o sistema respiratório – onde pode causar desde sintomas leves, semelhantes aos de um resfriado comum, como coriza, espirros e dor de garganta, até pneumonia e outros problemas mais graves –, a atuação da fisioterapia respiratória se torna essencial.

Profissional responde pela manutenção da função pulmonar

A atuação do fisioterapeuta no combate à Covid-19 começa logo na internação. Quando o paciente precisa ser hospitalizado, o profissional é um dos responsáveis pela manutenção de sua função pulmonar.

O fisioterapeuta também pode, de acordo com o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Coffito), oferecer oxigênio suplementar ao enfermo. O objetivo é manter a saturação arterial do gás.

Além disso, no caso de evolução para uma síndrome respiratória aguda grave (Sars, na sigla em inglês), em que o paciente necessite ser mantido em ventilação mecânica, o fisioterapeuta é um dos que respondem, na equipe de saúde, pela estratégia ventilatória. Cabe a ele escolher o modo e os parâmetros mais adequados para cada quadro.

Ainda segundo o Coffito, a avaliação do sistema pulmonar deve ser prioridade no diagnóstico fisioterapêutico no contexto da Covid-19.

“Faz-se uso de toda a semiologia pulmonar e exames complementares com o objetivo de identificar as disfunções presentes para delinear uma estratégia de tratamento”, destaca o Conselho.

Fisioterapeuta ajuda a aliviar sintomas relacionados à Covid-19

Os benefícios da fisioterapia no tratamento respiratório e na reabilitação de pacientes com Covid-19 hospitalizados também são destacados por um documento do Departamento de Fisioterapia da Sociedade Mineira de Terapia Intensiva (Somiti).

O texto, assinado em conjunto com a Associação Médica de Minas Gerais (AMMG) e a Associação de Medicina Intensiva (Amib), assinala que o papel do fisioterapeuta é melhorar o funcionamento respiratório e físico do paciente infectado pelo novo coronavírus. Dessa forma, o profissional trabalha para aliviar os sintomas e aumentar as atividades funcionais.

Outra indicação é quando há tosse produtiva, aquela com produção de muco ou catarro. Embora esse seja um sintoma pouco comum, presente em apenas 34% dos casos de Covid-19, o fisioterapeuta pode ajudar a remover as secreções nas vias áreas que o enfermo, sozinho, não consegue.

Pacientes de alto risco, acrescenta o documento, também podem se beneficiar do atendimento fisioterapêutico individualizado. São citados, por exemplo, casos de pessoas com comorbidades associadas à hipersecreção ou à tosse ineficaz (seca), como doenças neuromusculares, doenças respiratórias crônicas e fibrose cística.

Em entrevista à Folha de São Paulo, o fisioterapeuta João Naldoni Júnior, do Hospital do Coração, em Poços de Caldas (MG), acrescenta que, com um acompanhamento fisioterapêutico correto, o paciente de Covid-19 tende a melhorar mais rápido e usar menos medicamentos. Ademais, a fisioterapia diminui o risco de contrair outra infecção e aumenta a possibilidade de sair do hospital sem sequelas.

O fisioterapeuta no tratamento intensivo da Covid-19

Fisioterapeutas integram a equipe mínima de saúde no enfrentamento à Covid-19 em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs). A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determina a permanência do profissional, tanto em UTIs quanto em Centros de Terapia Intensiva (CTIs), por, no mínimo, 18 horas/dia. Mas dois projetos de lei – 1.985/2019 e 1.768/2020 – pedem a extensão desse prazo para as 24 horas do dia.

Numa UTI, o fisioterapeuta pode fornecer técnicas de higiene brônquica ao paciente ventilado mecanicamente, auxiliando na remoção de secreção pulmonar. Pode, ainda, auxiliar no posicionamento funcional de portadores de insuficiência respiratória grave associada ao novo coronavírus.

Uma das técnicas para otimizar a oxigenação arterial é a posição prona, na qual o paciente fica de bruços. De acordo com matéria da BBC Brasil, o método foi indicado em março pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para pacientes com Covid-19 que sofrem de síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA).

“Com esta manobra, a secreção acumulada na base do pulmão tende a mudar de lugar, e é possível ativar as vias áreas que estão deixando de funcionar. Assim, o alvéolo pulmonar começa a funcionar melhor, e o paciente, a ter menos dificuldade para oxigenar, o que reduz a sobrecarga cardíaca”, explica Naldoni Júnior.

Fraqueza pode agravar quadro de paciente em UTI

Outra possibilidade de atuação do fisioterapeuta, numa unidade de terapia intensiva, é junto ao paciente de Covid-19 que apresente fraqueza adquirida na UTI (Fauti). A condição, de acordo com o Departamento de Fisioterapia da Somiti, agrava a morbidade do enfermo e aumenta a mortalidade.

Pacientes de Covid-19 têm alto risco de desenvolver Fauti, alerta a entidade. O próprio tratamento da insuficiência respiratória grave causada pelo novo coronavírus contribui para esse quadro.

A Fauti também pode surgir em decorrência da necessidade de manejo médico intensivo. Isso inclui ventilação pulmonar prolongada e uso tanto de sedação contínua quanto de agentes bloqueadores neuromusculares.

“É fundamental antecipar a reabilitação precoce após a fase aguda da SDRA causada pela Covid-19, a fim de limitar a gravidade da Fauti e promover uma melhor recuperação funcional do indivíduo”, pontua o Departamento de Fisioterapia da Somiti.

Condutas fisioterapêuticas reduzem efeitos do imobilismo

Estratégias de mobilização precoce ajudam a amenizar os efeitos nocivos do imobilismo no paciente acamado por um longo período, observa artigo do site médico Sanar Med. As condutas fisioterapêuticas, de acordo com o texto, visam preservar ou melhorar a integridade e a amplitude do movimento articular e da força muscular.

Ainda conforme o site, as mobilizações podem ocorrer no leito e evoluir, por exemplo, para sedestação (colocar o paciente sentado) à beira da cama hospitalar. Outras possibilidades incluem treino de equilíbrio, cicloergometria (prova de esforço) e deambulação (ato de caminhar).

“Esse vasto leque de programas de exercícios traz benefícios que não estão restritos ao sistema musculoesquelético, mas trazem uma melhora do quadro geral do paciente, visto que a resposta da capacidade cardiorrespiratória é positiva frente a um exercício bem prescrito, diminuindo as complicações e sintomas da Covid-19”, destaca o artigo.

Logo após a internação, é comum que o paciente apresente cansaço, devido à perda de capacidade pulmonar. Também é frequente, nos casos mais graves, que tenha dificuldade de fazer atividades básicas, como escovar os dentes, por causa de um relaxante muscular usado na intubação.

Aliás, a musculatura de modo geral será prejudicada pela hospitalização – quanto mais tempo o enfermo passa internado, maior a necessidade de reabilitação. Repare, por exemplo, que, nas reportagens de TV, normalmente o paciente de Covid-19 deixa o hospital em uma cadeira de rodas.

“É um procedimento de segurança, mas também está ligado ao fato de a maioria ter dificuldade até para ficar de pé depois de tantos dias de internação, pois a fraqueza muscular é muito grande”, observa Naldoni Júnior.

Para o paciente recuperado da Covid-19, o fisioterapeuta indica atividades corriqueiras, como sentar e levantar e subir e descer escadas. No entanto, ele ressalta, a prescrição deve ser individualizada.

Fisioterapeuta coordena serviço para pacientes de Covid-19 que tiveram alta

Pesquisa do Centro de Doenças Infecciosas do Hospital Princess Margaret, de Hong Kong, estima que um quarto dos pacientes curados de Covid-19 apresente de 20% a 30% de perda da função pulmonar. Essa alta demanda por cuidados pós-alta torna urgente a disponibilização de serviços de fisioterapia respiratória “prontamente aptos” para atender a procura, conforme alerta o site Sanar Med.

A fim de assistir pessoas em recuperação da doença, a Universidade Veiga de Almeida (UVA), do Rio de Janeiro, criou um grupo de reabilitação pulmonar para atendimento de fisioterapia respiratória por teleconsulta. Gratuitas, as consultas virtuais são feitas por professores da Faculdade de Fisioterapia da UVA, com apoio de alunos voluntários.

“Mesmo após a alta hospitalar, se o paciente se queixa de falta de ar ou perda da capacidade pulmonar, precisa iniciar um trabalho de fisioterapia respiratória o mais rapidamente possível. Tempo é um fator primordial na recuperação dos músculos respiratórios”, afirma, em entrevista ao site da UVA, o fisioterapeuta Yves de Souza, responsável pelo teleatendimento.

De acordo com o fisioterapeuta, há dois perfis de pacientes de Covid-19 que necessitam do tratamento. O primeiro é formado por pessoas que apresentaram sintomas graves da doença, com passagem pela UTI. No outro grupo, está quem foi internado com quadro mais brando, mas não se sente tão disposto e ativo quanto antes.

Sequelas podem ficar inalteradas, melhorar ou piorar

À Folha de São Paulo, Souza explica que ainda não se sabe se problemas pulmonares decorrentes da Covid-19 têm característica estática, regressiva ou progressiva.

A sequela, na primeira possibilidade, é duradoura; na segunda, melhora com tratamento; e na terceiro, o pior cenário: piora com o tempo.

“É difícil afirmar qualquer coisa dentro de uma realidade em que a gente não conhece tudo, mas os pacientes menos graves também evoluem [para] uma dificuldade respiratória significativa, que afeta a parte funcional”, avalia.

Os exercícios propostos são parte de uma pesquisa da UVA para mensurar os benefícios da fisioterapia para o paciente de Covid-19 após a alta hospitalar.

Os interessados nos atendimentos a distância devem enviar e-mail para comunicacaoinstitucional@uva.br.

Fisioterapia na prevenção da Covid-19

Pessoas que ainda não foram infectadas pelo novo coronavírus também podem se beneficiar de exercícios para fortalecer a musculatura respiratória e aumentar a capacidade pulmonar.

De acordo com o site Eu Atleta, quem faz atividade física ou exercícios para fortalecimento da musculatura respiratória regularmente tem mais capacidade de enfrentar quadros infecciosos como o do novo coronavírus. Assim, evita chegar ao ponto de ser submetido à intubação orotraqueal ou à ventilação mecânica invasiva.

O pneumologista Rodrigo Santiago assegura que é possível evitar a forma mais grave da doença com a prática de fortalecimento pulmonar:

“Se uma pessoa contaminada pelo vírus tiver a imunidade boa, alimentação balanceada, [estiver] bem hidratada, dormir bem, além da regularidade na prática física, (…) tem muito menos chance de evoluir com a forma grave da doença.”

O Eu Atleta destaca ainda que a fisioterapia respiratória é uma das práticas que podem ser adotadas para o fortalecimento da musculatura pulmonar. Segundo o site, a especialidade “visa melhorar a dinâmica respiratória e a distribuição do ar inalado pelo pulmão, além de remover secreções brônquicas, resultando assim na melhora da função pulmonar”.

Naldoni Júnior concorda:

“Quanto mais saudável o paciente entra no hospital, mais fácil é para ele sair”, diz o fisioterapeuta.

O profissional lembra também que um pulmão com a musculatura fortalecida funciona de maneira mais eficiente, com menos esforço. Por isso, sobrecarrega menos o coração.

6 exercícios para fortalecer a musculatura respiratória

À Folha de São Paulo, o fisioterapeuta Rodrigo Peres, sócio-fundador da clínica Central da Saúde, indica algumas atividades preventivas. Elas não evitam pegar a Covid-19, mas ajudam a fortalecer a musculatura respiratória e a aumentar a capacidade pulmonar.

São seis exercícios simples, que devem ser executados em duas séries de dez repetições cada, de pé ou sentado. Mas, neste último caso, sem nenhum encosto nas costas.

Confira a seguir:

1 – Inspire pelo nariz e expire pela boca.

1 – Inspire pelo nariz e expire pela boca.

2 – Inspire duas vezes seguidas pelo nariz e expire duas vezes seguidas pela boca.

2 – Inspire duas vezes seguidas pelo nariz e expire duas vezes seguidas pela boca.

3 – Inspire três vezes seguidas pelo nariz e expire três vezes seguidas pela boca.

3 – Inspire três vezes seguidas pelo nariz e expire três vezes seguidas pela boca.

4 – Puxe o ar o quanto conseguir e segure de 5 a 10 segundos. Depois, solte-o de uma vez pela boca.

4 – Puxe o ar o quanto conseguir e segure de 5 a 10 segundos. Depois, solte-o de uma vez pela boca.

5 – Puxe o ar o quanto conseguir. Depois, solte-o com os lábios cerrados.

5 – Puxe o ar o quanto conseguir. Depois, solte-o com os lábios cerrados.

6 – Inspire levantando os braços na lateral do corpo. Depois, expire soltando os braços.

6 – Inspire levantando os braços na lateral do corpo. Depois, expire soltando os braços.

Fisioterapia respiratória para além da Covid-19

Conforme explica a Agência Brasil, a fisioterapia respiratória é uma especialidade que atua na reabilitação do sistema respiratório, com repercussão também no sistema cardíaco.

“Apesar de a gente nascer com a função da respiração, sabendo respirar, que é um ato involuntário, constante o tempo todo, há uma série de doenças que podem afetar o sistema respiratório e você vai precisar do atendimento do fisioterapeuta”, comenta Roberta Correia, responsável pela Fisioterapia Respiratória do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz).

Roberta lembra que as pessoas acabam conhecendo a fisioterapia respiratória no momento mais crítico da vida – ou seja, dentro do hospital.

“A gente tem um trabalho muito grande a nível ambulatorial e domiciliar, mas é no CTI que a fisioterapia funciona 24 horas por dia. A gente vai desde o momento em que o paciente entra na emergência com sinais de desconforto respiratório até a alta e sua ida para casa”, ressalta.

Ainda de acordo com a Agência Brasil, pacientes com doenças crônicas, como enfisema pulmonar e asma, também necessitam do fisioterapeuta respiratório.

“Além de ter a especialidade na área respiratória, a gente também atende desde o recém-nascido prematuro que nasce com o sistema respiratório ainda mal formado até o indivíduo adulto e idoso também na fase terminal”, detalha Roberta.

Crédito, para que te quero

Este artigo foi escrito pela nossa equipe de redação, sob a supervisão do fisioterapeuta André Guzmán.

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